sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Tiradentes 2019 - Crítica: "A Rainha Nzinga Chegou"

(idem, dir. Junia Torres e Isabel Casimira Gasparino)

Cena de "A Rainha Nzinga Chegou"


É um bocado estranho que um documentário tão convencional quanto “A Rainha Nzinga Chegou” tenha sido escolhido para um festival como Tiradentes. Ou nem tanto: apenas reforça o quanto esta edição tem dado preferência à temática política em detrimento da inovação estética.

Dirigido por Junia Torres e Isabel Casimira Gasparino, o filme acompanha um grupo mineiro de descendentes de escravos que luta para preservar as tradições e cultura trazidas da África por ancestrais. A líder da comunidade, denominada “rainha”, é a guardiã de todo o conhecimento e a memória do que foi transmitido por seus antepassados. Já idosa, começa a se preocupar em passar a coroa a outra pessoa capaz de tocar adiante o projeto de preservação daquela cultura.

Com sua morte, quem assume é sua filha mais velha, Isabel (codiretora do filme). Ela vai a Angola buscar um maior contato com suas raízes e se certificar de que é mesmo capaz de ser a nova rainha.

A história é muito bonita, e enquanto material etnográfico/documento de preservação cultural, o filme é de importância inestimável. Cinematograficamente, porém, não tem grande pujança – muito embora tenha pelo menos uma sequência brilhante, sobretudo se pensarmos em sua extraordinária simplicidade (apenas uma questão de montagem precisa e movimento de câmera perspicaz): a que revela a morte da rainha.

O filme tem outros momentos fortes, como quando a nova rainha descobre ao lado do seu hotel em Angola um canteiro com um tipo de planta cujas sementes são exatamente as mesmas que servem de material para a confecção de sua coroa. Ou quando ela pisa nas marcas de pegadas de uma antepassada e improvisa um canto alegre e emocionado. Ou ainda quando os parentes distantes da África lhe confirmam que várias das tradições que sua mãe lhe repassou são, de fato, muito semelhantes às que eles possuem em Angola.

Mas o filme já valeria nem que para observar o rosto de Isabel em dois momentos: primeiro quando sua mãe, ainda viva, cogita que será ela a nova rainha (e ali vemos em seu semblante o quanto ela estava insegura sobre sua capacidade de ser a nova líder) e, depois, já na África, após ter aceito o desafio e se encontrar com os antepassados (seu rosto muda por completo: passa a esbanjar confiança e até a exibir uma aura mística própria de uma liderança ciente de sua sina espiritual).


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