quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Crítica: "A Grande Aposta"

(The Big Short, 2015), de Adam McKay


Christian Bale em "A Grande Aposta"

Christian Bale é um ator especial. É o tipo de intérprete criativo, que nunca entrega uma performance banal – uns 50 atores eficientes poderiam ter bons resultados vivendo um mesmo personagem que ele, mas Bale sempre busca ir além, fazer algo diferente mesmo quando o papel a priori não permite nada de muito inovador. Em "A Grande Aposta", ele interpreta um investidor que previu o colapso no setor imobiliário americano em 2008 – e soube faturar em cima da própria capacidade de visão. Mas mais que um visionário, ele é acima de tudo um sujeito excêntrico, que passa grande parte do tempo ouvindo heavy metal, simulando tocar bateria, e que vai trabalhar usando camisetas puídas (em um ambiente em que os colegas são engravatados e cheios de cerimônia). Para completar, ainda tem um estranho olho de vidro – as pessoas riem de sua figura onde quer que vá.

Bale demonstra grande disposição e disponibilidade para criar seu personagem – a ponto de, às vezes, dar a impressão de que talvez queira superar tudo o que ele mesmo já fez em termos de inventividade em filmes anteriores. Mas definitivamente não era ocasião para isso. Ele atua como se seu personagem tivesse uma interioridade complexa, uma profundidade riquíssima e interessantíssima a ser explorada. Mas quando o observamos em cena, percebemos que ele está visivelmente criando em cima de uma enorme abstração – ou, o que é pior: em cima de um gigantesco vazio; esse personagem que Bale quer a todo custo "compor" simplesmente inexiste.

Por estilo, "A Grande Aposta" de fato exigia um certo exagero nas atuações – é uma comédia algo rasgada sobre o mundo das finanças. Mas Bale seguiu um caminho que visivelmente destoa do resto do elenco – que, em geral, opta por um tom mais farsesco. Muita gente pode achar que é uma performance "melhor" que as demais, mas desta vez a composição de Bale é fruto de um grande erro de approach do personagem: é puro overacting.

"A Grande Aposta" explica em detalhes o que aconteceu na economia americana em 2008, quando só alguns poucos investidores espertos perceberam que a boa fase do setor imobiliário nos EUA estava com os dias contados; em breve, entraria em crise. Como é um filme voltado para o grande público, obviamente os roteiristas (McKay e Charles Randolph) sabiam que precisariam adotar um tom didático, quase que destinado a dummies para detalhar questões que o puro e simples "economês" dificilmente conseguiria.

De fato, "A Grande Aposta" seria um filme inconcebível se não fosse esse esforço hercúleo por parte da equipe de tornar tudo amaciado, palatável. Toda a pirotecnia visual e os truques espertinhos e criativos para manter a narrativa com fôlego do início ao fim tem funcionado com grande parte do público – o longa tem feito um inusitado sucesso comercial. Como em uma espécie de milagre, o diretor tem conseguido não só explicar em detalhes um assunto impopular como também tem mostrado que um meio aparentemente tedioso como o das finanças pode ser fascinante.


Minha opinião pessoal? Levando em conta que o estilo engraçadinho de McKay não é exatamente algo que me agrade e que tampouco a bolha imobiliária seja um tema que me desperte a atenção, é até de admirar que eu tenha chegado ao fim do filme ainda com algum interesse. Mas muito pouco – os excessos narrativos me deixaram um tanto exausto, e o didatismo de McKay funcionou só parcialmente comigo: em vez de compartilhar da visão do diretor de que o imprevisível universo das finanças é apaixonante e cheio de empolgação, eu continuo achando esse meio completamente anticinematográfico. E, além de moralmente repulsivo, chato de doer... O milagre de McKay, como se percebe, não acontece para todos.

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