Atli Oskar Fjalarsson, em cena de "Pardais" |
Este drama premiado no Festival de San Sebastián se passa em
um vilarejo isolado no noroeste da Islândia. A paisagem é muito bonita, embora seja
de uma beleza demasiado fria – tanto na temperatura como em espírito. Mas o
diretor islandês Rúnar Rúnarsson evita explorar o potencial estético da
natureza da região; aliás, até usa a câmera digital com um desleixo
inexplicável – não nos enquadramentos, mas na luz. A luminosidade estoura em um tom amarelado
que invade os objetos em cena, e há outras com imagens tão terrivelmente
granuladas que trazem à memória os televisores antigos, que ficavam tomadas por
“fantasmas” ao fundo quando a antena ficava fora de sintonia.
Ainda não entendi a razão dessa despreocupação com a qualidade
da imagem (ou será que o problema era da sala de projeção?), até porque
Rúnarsson se demonstra altamente atencioso com todo o resto de seu filme. Mesmo visualmente, as composições dos quadros são muito bem arquitetadas, com algumas imagens realmente expressivas - há inclusive uma inspiração felliniana em algumas (quando dois rapazes observam idosas saculejando seus corpos flácidos em uma aula de hidroginástica; ou quando uma mulher parruda se oferece e faz sexo com um jovenzinho bem mais franzino que ela).
O filme é sobre a relação entre pai e filho – um pós-adolescente que
precisa amadurecer na marra para cuidar do pai, um sujeito imaturo e indisciplinado.
O garoto é sensível, civilizado e urbano; já é praticamente adulto, mas preservou
uma voz infantil para o canto, quase a de um castrato, que ele põe para fora de vez em quando, em corais de
igreja (ou sozinho, em uma espécie de autoterapia). Já o pai é um caipirão, um pouco
menos rude que um ogro, mas só um pouco; sua existência se limita a esperar
pelas deprimentes festas que dá em casa, na qual amplia o ventre já inflado com
latas e mais latas de cerveja.
O garoto Atli Oskar Fjalarsson é sensacional. Parece um Tobey
Maguire mais esguio e desajeitado, mas um Tobey com um talento que vai bem além
de entortar os lábios e fazer cara de bom moço. O olhar dele nas cenas
dramáticas é de uma expressividade rara. Ingvar
Eggert Sigurosson, no papel do pai, também está ótimo, e eles fazem uma tocante dupla nas cenas em que os dois se esforçam na vã tentativa de estabelecer uma relação entre duas pessoas sem a menor afinidade.
O longa é conduzido com leveza e equilíbrio até quase o
final, quando muda o tom; torna-se grave, desesperador. Depois de uma terrível
(e magnificamente dirigida) cena de violação sexual, o rapaz precisa tomar uma atitude drástica; seu amadurecimento de fato acontece ali. Seu ato é tão inesperado e cheio de grandeza que o público entra em choque; o filme parece ter recomeçado em um novo registro, bem mais tenso. Mas logo depois, o roteiro comete um
deslize fatal: faz apelo desnecessário ao drama fácil, quando a situação por si só já
era muito mais do que dramática – era trágica. O filme quase implode ali, mas o
que já havia sido construído até então era tão sólido que a estrutura não é abalada. E a
cena final, simples ao extremo, redime qualquer delize. Rúnnarson é uma grande
promessa.
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